Menina que teve aborto negado tem risco de aborto clandestino e suicídio, diz funcionário

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A adolescente de 13 anos que teve o aborto legal negado em Goiás manifestou desejo de realizar a interrupção da gravidez de forma clandestina e apresenta risco de cometer suicídio, segundo relato de um funcionário do hospital no qual ela foi atendida e que pediu para não ter a identidade revelada por terem represália.

 

A pessoa afirma que a última vez que a menina esteve no hospital para uma consulta pré-natal foi no dia 9 de julho. Ela também tem recebido orientação para eventual entrega voluntária do bebê para adoção. A gravidez é considerada de alto risco.

A adolescente, que não estava comparecendo aos exames pré-natal, esteve no hospital após uma medida judicial, acompanhada de equipe técnica do Juizado da Infância e da Juventude. O pai dela também esteve no local, com advogados, e alegou que ela não seria mais levada ao hospital pois estaria recebendo atendimento em uma clínica particular, segundo a funcionário.

A adolescente engravidou após ser vítima de um estupro de vulnerável de um homem de 24 anos. Porém, teve o procedimento de aborto legal negado pela Justiça. Ela manifestou desejo de interromper a gravidez, mas o pai dela foi à Justiça contra a realização do procedimento.

A desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva, do TJ-GO (Tribunal de Justiça de Goiás), acatou o pedido do pai, que afirmou que o feto tem direito à vida e alegou que delito de estupro está “pendente de apuração”.

Apesar do argumento do pai, a lei brasileira estabelece que qualquer tipo de relação sexual com uma pessoa com menos de 14 anos é considerada estupro de vulnerável.

A reportagem procurou o Ministério Público e questionou se o órgão entrou com pedido para reverter a decisão. A Promotoria afirmou que está acompanhando o caso, mas que o processo corre em segredo de Justiça e por isso não seria possível passar nenhuma informação.

De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, uma pessoa foi estuprada no Brasil a cada seis minutos em 2023, sendo que 62% das vítimas têm até 13 anos. O número de estupro de vulnerável cresceu 7,5% no Brasil de 2022 (59.761 casos) para 2023 (64.237).

Ainda em relação ao caso da menina do Goiás, funcionários do hospital afirmam que o pai da adolescente alegou que a filha havia desistido de fazer o aborto e que entregaria o filho para ser cuidado pelo avô. No entanto, de acordo com pessoas que conversaram a jovem, ela mantém a vontade de interromper a gestação e disse que as afirmações do pai não correspondem com a verdade.

Também relatou que, caso não consiga a interrupção da gravidez, que já caminha para a 29ª semana, e o destino do bebê seja a adoção, não quer que a criança fique com seu pai, pois não acredita que ele vá cuidar.

O homem, de 24 anos, nunca acompanhou a adolescente no hospital.

Ainda no hospital, ela afirmou a funcionários que o pai parou de trabalhar por 30 dias para vigiá-la, mas que ela deseja estudar para ter uma vida diferente da mãe -que vive em outro estado. Ela também afirmou sofrer assédio sexual por parte de outros homens próximos da família.

A Folha de S.Paulo teve acesso a documentos do caso. Na decisão da desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, é exposto que o pai da menina alega que sua filha se “sentiu pressionada pelas imposições do Conselho Tutelar” para interromper a gravidez.

A testemunha ouvida pela reportagem, porém, diz que a jovem nega pressão e que afirma que decidiu interromper a gravidez após conversar com a mãe. A reportagem entrou em contato com a mãe da adolescente, que não quis comentar o caso.

O pai da jovem é representado por três advogados, Viviane Porto Pereira, Apoena Nascimento Veloso e Jennifer Puls Gama.

Apoena integra a Comissão de Defesa da Vida da Associação dos Juristas Católicos de Goiás, que se considera “vigorosamente contrária a questões como aborto e eutanásia”. Jennifer já integrou a banca de um TCC (Trabalho de Conclusão de Curso), em 2014, sobre o “Direito à Vida: A Problemática do Aborto no Projeto do Código Civil”.

SEM AULA E SEGUNDO CASO DE ABUSO SEXUAL

Este não é o primeiro caso de abuso sexual sofrido pela adolescente. De acordo com documentos do Conselho Tutelar, de abril deste ano, a menina já denunciou outro caso, quando tinha 12 anos.

Segundo o documento ao qual a reportagem teve acesso, a adolescente contou o ocorrido para uma professora e manifestou medo de ter engravidado.

Na ocasião, ela também foi encaminhada para o IML (Instituto Médico Legal), onde realizou exames, e seguiu protocolos de proteção contra IST (Infecção Sexualmente Transmissível). Também foi registrado um boletim de ocorrência sobre o caso, e o exame de gravidez deu negativo.

O Conselho Tutelar afirma ainda, em um dos documentos, que a adolescente está afastada da escola desde 2023. Diz também que a jovem já era acompanhada por um conselheiro devido às faltas. O pai foi advertido.

Quanto a isso, o documento menciona que o Conselho Tutelar vai requerer matrícula especial para a adolescente em uma escola.

Também foi solicitado, em março, que a menina começasse a realizar exames pré-natal mensalmente, que até abril não estavam sendo realizados.

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