Jovem que arrecadou mais de R$ 30 mil na Irlanda para tratar câncer mentiu sobre diagnóstico

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A brasileira residente na Irlanda Laís Basílio, 23, arrecadou mais de EUR 5.000 (equivalente a cerca de R$ 30.155) mentindo sobre ter câncer. No último sábado (10), ela publicou um vídeo em suas redes pedindo desculpas pelo ocorrido. O episódio causou revolta entre a comunidade brasileira no país, doadores e internautas nas redes sociais.

 

“Se eu iniciei isso botando a minha cara aqui, eu vou terminar isso botando a minha cara aqui também. Estou aqui para arcar com todas as consequências, sejam quais forem. Gostaria muito de pedir perdão a toda comunidade brasileira, toda comunidade oncológica, eu sei que tudo isso cai sobre vocês”, disse no vídeo, afirmando que nenhum de seus familiares ou conhecidos estava envolvido na mentira.

[Página de Laís Basílio para arrecadação de dinheiro]© Reprodução  

Nesta segunda-feira (12), a jovem já havia apagado todas suas postagens das redes, deixando apenas o pedido de desculpas. A reportagem tentou contato, mas não teve resposta até o horário de publicação desta reportagem.

Em uma vaquinha criada no final de maio na plataforma GoFundMe, Basílio afirma que descobriu o câncer, sem especificar o tipo, no fim de 2023, que não estava trabalhando desde o diagnóstico e que precisava de dinheiro para pagar as contas. “Agradeço a todos de coração e qualquer ajuda é bem-vinda”, escreveu.

Desde então, ela recebeu 279 doações, que atingiram mais da metade dos EUR 10 mil (cerca de R$ 60 mil) esperados. A página continua aberta para doações no site, conforme último acesso feito nesta segunda. Contatada, a assessoria da plataforma GoFundMe não respondeu até a publicação desta reportagem.

De acordo com internautas ouvidos pela Folha, a brasileira já estava pedindo dinheiro antes de abrir a vaquinha. O caso começou a ganhar visibilidade nas redes e então ela criou a página de arrecadação. A comunidade começou a desconfiar após Basílio ser vista na balada, no bar, saindo na rua e dançando em vídeos nas redes. Ela foi então pressionada sobre a história.

Numa entrevista de maio dada ao Bolder Podcast, que discute a vida da comunidade brasileira na Irlanda, Basílio dá detalhes sobre a suposta doença, desde sintomas iniciais até o tratamento. Ela também afirma que os médicos não iriam dar continuidade porque os remédios já não eram responsivos. Seu corpo aguentaria 48 dias sem tratamento e precisava urgentemente de um transplante de medula óssea. Caso contrário, o câncer seria declarado terminal.

Em nota à Folha, o apresentador do podcast, Fillipe Cardoso, disse que a comunidade ficou “extremamente chocada” com o ocorrido. Desde que a mentira foi descoberta, iniciou-se uma “caça às bruxas” de pessoas querendo expor e se vingar de Basílio, conta Cardoso.

“Muita gente fez campanha, orou, doou dinheiro e torceu por ela, e se sentem traídos neste momento”, disse Cardoso.

Quando descobriu que a história poderia ser mentira, o apresentador diz que entrou em contato com a brasileira, mas “as incongruências foram aumentando, e as respostas dela eram cada vez mais evasivas. Ela não conseguiu me convencer de nada”.

No último sábado (10), a ONG Amor, Simples de Doar, que presta apoio a brasileiros com câncer na Irlanda, lamentou o ocorrido em suas redes. “Estamos profundamente decepcionados com as notícias recentes, mas não iremos parar. Existem outras pessoas que realmente precisam de ajuda, e vamos focar nossa energia em continuar a dar amor e apoio”. O grupo havia ajudado a dar visibilidade ao caso de Basílio.

Após o ocorrido, internautas afirmam que a brasileira teria voltado ao Brasil na madrugada de domingo (11).

Consequências para pacientes reais

A superexposição de doenças nas redes gera desconfiança generalizada, especialmente em casos falsos, o que pode diminuir o número de doações, diz o advogado criminal Jorge Calazans. “Isso dificulta a captação de recursos para tratamentos reais, além de aumentar o estigma e a discriminação contra quem enfrenta doenças graves”, afirma.

“É o mesmo que ocorre quando uma informação falsa causa uma busca desenfreada por um dado medicamento vendido sem receita médica, causando desabastecimento para quem realmente precisa daquele remédio”, completa a advogada Claudia de Lucca Mano.

A internet é grande aliada nas causas de doenças e pacientes, mas também facilita a proliferação de golpes, diz Walter Cintra, professor do FGV saúde. “A gente precisa desenvolver canais confiáveis para que as pessoas possam ser beneficiadas e quem quiser ajudar não seja enganado”.

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