Salão de beleza da família de Didja Cardoso tem ‘atividades veterinárias’ em CNPJ
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SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – O CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) de uma das unidades do salão de beleza da família de Djidja Cardoso tem, como uma das atividades econômicas secundárias, “atividades veterinárias” e “comércio de animais”.
O salão Belle Femme está registrado no nome de Cleusimar Cardoso, mãe de Djidja. A informação consta no banco de dados do governo federal.
A Polícia Civil investiga como a família de Djidja conseguia acesso para comprar cetamina. A venda é proibida e a substância é de uso veterinário.
O UOL entrou em contato a polícia para esclarecer se as atividades que constam no CNPJ podem ter relação com a compra da droga. Se houver retorno, o texto será atualizado.
Vídeos que circulam nas redes sociais mostram que Cleusimar gravava os filhos sob efeito de cetamina. Em alguns momentos, ela também havia usado a droga.
Gravações foram feitas na casa onde Djidja Cardoso foi encontrada morta, na zona norte de Manaus. No vídeo, Cleusimar mostra a quantidade que ela e os filhos aplicaram da droga. “Eu tenho cetamina aqui, estou filmando”, diz. Em seguida, ela pontua que Ademar aplicou “três seringas” com a substância. “Ele tomou três seringadas e não está conseguindo ficar em pé”.
Ademar Cardoso aparece no vídeo sem conseguir se mexer em cima da cama. “Djidja, o que está acontecendo com ele [Ademar], por que tu está duro, te endireita, menino”, pede a mãe, que grava a cena com o próprio celular.
O QUE É A CETAMINA
Trata-se de um anestésico hospitalar. É usado em diversos países, incluindo o Brasil, com a finalidade de sedação para humanos e outros animais. É apelidada de “tranquilizante para cavalos”.
Remédio não pode ser usado em casa. Tanto a forma em spray nasal quanto a intravenosa para tratar depressão devem ser administradas exclusivamente em hospital ou clínica especializada e na presença de um profissional da saúde. A substância não está disponível no SUS (Sistema Único de Saúde).
Anestésico dissociativo. Quando usada como anestésico, tem efeitos alucinógenos, com sensação de bem-estar. Em doses menores, quem consome a substância pode se sentir eufórico e ter episódios de sinestesia -mistura de sensações relacionadas aos sentidos, como “ver” sons e “ouvir” cores.
Melhor conexão entre células. Ao ser administrada, a substância entra no cérebro, dispara um processo de religação de neurônios e sai do organismo em aproximadamente 20 horas. Dessa forma, as células passam a “conversar” melhor umas com as outras, havendo uma melhor conexão. Com isso, as áreas afetadas pela doença mental voltam a funcionar melhor e os pacientes percebem uma melhora dos sintomas de depressão.
Apesar dos efeitos benéficos, existe uma preocupação em torno da cetamina. O alerta é semelhante ao da prescrição de opiáceos (medicamentos com efeitos analgésicos e sedativos potentes) e há risco com uso indevido, porque pode viciar.
Djidja foi encontrada morta dentro de casa em Manaus no dia 28 de maio. A suspeita é de que ela tenha sofrido uma overdose.
Família Cardoso já era investigada por liderar um grupo religioso. Seita forçava seguidores a usar cetamina para “transcender a outra dimensão e alcançar um plano superior e a salvação”, diz a polícia.
Grupo fazia “rituais com o uso indiscriminado de cetamina”, diz polícia. As investigações apontam que algumas vítimas passaram por violência sexual e aborto.
Investigações começaram com pai de vítima na delegacia. “O pai da companheira de Ademar resgatou a filha dopada e a levou à delegacia, relatando os fatos há cerca de 40 dias”, diz o delegado. Segundo a polícia, “seita” funcionava há pelo menos dois anos no bairro Cidade Nova, em Manaus.
Cleusimar e Ademar teriam se apresentado na delegacia como Maria e Jesus, diz advogado. “A mãe de Djidja se identificou como Maria, mãe de Jesus, e disse que o filho era Jesus, eles não tinham noção. Isso aconteceu logo depois da prisão, entrei na sala e eles falaram isso”, afirma Vilson Gomes Benayon Filho. “Eles também convidaram o delegado para experimentar, tomar conhecimento da espiritualidade”, afirmou.
Defesa negou a existência da seita. “Não existe esse negócio de ritual e de que funcionários e amigos eram obrigados ou coagidos a usar a droga. Não existia isso. Eles ofereciam sob efeito de drogas, com aquele argumento, com aquela alegação da transcendência da evolução espiritual”, argumentou a advogada Lidiane Roque.
“Não existe seita, não existe ritual macabro. Todas as declarações deles, os vídeos que circulam na internet, todas as provas que estão no inquérito são fruto de alucinações extremamente severas, de uma droga que está destruindo famílias”, disse Nauzila Campos.
As advogadas também cobraram a prisão do dono da clínica veterinária que fornecia a droga à família. “Os fornecedores de droga são os verdadeiros traficantes. E a gente questiona, cadê o dono dessa clínica veterinária que não foi preso até agora? A pessoa viciada, o dependente químico faz de tudo para alcançar a droga, e o dependente químico não é traficante. O traficante é um comerciante que precisa lucrar e faz de tudo e se aproveita da vulnerabilidade dos dependentes”, questionou Nauzila.
A defesa considera que a operação da Polícia Civil salvou a vida dos envolvidos. “A prisão salvou a família, salvou a vida deles. Se essa operação tivesse sido deflagrada algumas semanas atrás, a Djidja estaria viva. Ela estaria presa, mas estaria viva”, destacou Lidiane.
COMO ERA O LOCAL DOS RITUAIS
Cheiro ruim no espaço dos rituais. “A casa tinha cheiro de carne em estágio de putrefação”, disse o delegado. Segundo ele, os suspeitos tinham lesões na pele “tipo necrose por conta das aplicações”. A polícia esteve no local no dia em que Djidja Cardoso morreu e na ocasião das prisões preventivas.
Foram encontradas seringas, doses de cetamina, frascos vazios, medicamentos, computadores e documentos. Vítimas eram mantidas “despidas e sem se banhar durante todo período”, aponta investigação.
Duas vítimas identificadas até o momento. Cárcere privado e estupro de vulnerável estão entre os crimes apontados. A polícia identificou ao menos duas vítimas que teriam sido mantidas sob cárcere privado e sido estupradas sucessivas vezes por membros do grupo durante dias.
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